Em defesa da vida

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É significativa, e ao mesmo tempo gratificante a oportunidade que este Curso está me proporcionando, permitindo que neste dia em que o mundo reverência São Francisco de Assis, possa estabelecer uma relação entre a dimensão fraterna e solidária de sua existência e o que esta ocorrendo no Brasil com um Rio, também chamado Francisco, vítima de visões reducionistas que estão conduzindo a uma distorção da realidade e a uma possível destruição do “velho Chico” em pouco espaço de tempo.

Este fato reforça, quão urgente e necessário se faz reascender a responsabilidade em relação a natureza. Trata-se de uma responsabilidade moral, a qual ultrapassa as normas dos direitos e deveres. É uma “responsabilidade coletiva” que somente tem possibilidade de acontecer se houver uma “consciência universal”, sendo este o único caminho que pode por freios a enlouquecida corrida tecno-cientifica e proporcionar às gerações futuras um ecossistema equilibrado e harmônico.

Também, aprendi neste curso com o professor Amarildo Ferrari que: se colocarmos o cuidado como central em nossas vidas e permitirmos o sentimento acontecer haveremos de potencializar a solidariedade com a humanidade e as gerações futuras. Nesse sentido, cita Leonardo Boff, reafirmando sua crença na Ética da responsabilidade como forma solidária de exercer o cuidado com os demais seres da natureza. Esta re-ligação é a linha mestra que conduz a uma relação fraterna entre os seres, permitindo ao ser humano entender-se como parte da criação e construtor de um universo equilibrado e sem falsos moralismos.

É nesse contexto que situamos o gesto fraterno de Dom Luiz Flávio Cappio,OFM, bispo de Barra, interior da Bahia que iniciou em 26/09 próximo passado, greve de fome para tentar impedir a implantação do projeto de transposição do Rio São Francisco, escolhendo para sua permanência uma capela próxima ao Rio e da cidade de Cabrobó, em Pernambuco, região na qual o Governo pretende “construir uma das tomadas de água” para a transposição do que lhe resta , considerando que o São Francisco já teve vazões de mais de 15.000 metros cúbicos por segundo e hoje é de pouco mais de 2.000 , precisando urgentemente de um processo de revitalização.

Com uma referência ao “nome de Jesus Ressuscitado que vence a morte pela Vida plena” inicia sua declaração, a qual foi registrada em cartório e encaminhada por carta ao Presidente Lula, onde expõe as razões de seu ato caso não haja uma reversão da decisão governamental.

Sua carta, constituí-se em verdadeiro exemplo do que aprendi durante o Curso que ora se encerra, razão pela qual entendo oportuno inseri-la neste trabalho.

Barra, 26 de setembro de 2005
Senhor Presidente

Paz e Bem!

Quem lhe escreve é Dom Frei Luiz Flávio Cappio, OFM, bispo diocesano de
Barra,naBahia.
Tive a oportunidade de conhecê-lo por ocasião da passagem do senhor por Bom
Jesus da Lapa, na Caravana da Cidadania pelo São Francisco, em 1994. Isto
aconteceu pouco tempo depois que fizemos uma Peregrinação pelo Rio São
Francisco, da nascente à foz, com objetivo de conscientizar o povo
ribeirinho sobre a importância do rio para a vida de todos e a necessidade
de preservá-lo.
Fui-lhe apresentado por meu professor de teologia, Frei Leonardo Boff.
Sempre fui seu admirador. Participei ativamente em todas as campanhas
eleitorais do PT, alimentando o sonho de ver o povo no poder.
Desde que o Governo Fernando Henrique apresentou a proposta de transposição
do Rio São Francisco, fomos críticos acirrados deste projeto. Desde então
acentuamos a necessidade urgente de revitalização do rio e de ações que
garantam o verdadeiro desenvolvimento para as populações pobres do nordeste:
uma política de convivência com o semi-árido, para todos, próximos e
distantes do rio.
Esperávamos do senhor um apoio maior em favor da vida do rio e do seu povo.
Esperávamos que, diante de tantos e consistentes questionamentos de ordem
política, ambiental, econômica e jurídica, o governo revisse sua disposição
de levar a cabo este projeto que carece de verdade e de transparência.
Quando cessa o entendimento e a razão, a loucura fala mais alto. Em meu
gesto não existe nenhuma atitude anti-Lula neste momento delicado da vida
nacional.
Pelo contrário. Quem sabe seja uma maneira extrema de ajudá-lo a entender
pelo coração aquilo que a razão não alcança.
Tenha certeza é um profundo testemunho de amor a vida.
Minha vida está em suas mãos.
Receba minha saudação fraterna e amiga.
Dom Frei Luiz Flávio Cappio,OFM”

Espero, que nós brasileiros sejamos solidários e saibamos nos unir a essa voz que com coragem , isto é, agindo com o coração, está sabendo demonstrar que a dimensão fraterna de seu gesto se realiza no nível do sentimento e não da razão.

Autora: Ana Maria de Arruda Frejuello Límoli

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